Empresa gaúcha em Hannover busca tecnologia alternativa à conexão por internet no campo

Um dos grandes desafios do agronegócio gaúcho é a conectividade no campo. Com máquinas agrícolas e equipamentos cada vez mais modernos, o acesso à internet ainda é uma dificuldade para boa parte dos produtores rurais implementarem inovações.

Em um mundo em que o uso de dados e a Inteligência Artificial ganham espaço para melhorar a performance em todos os setores da economia, uma solução a esse entrave pode fazer produtores rurais darem um salto, fator decisivo para a economia do Rio Grande do Sul.

Pois a gaúcha Novus está trabalhando para lançar uma nova tecnologia que pode dar uma resposta a esse problema. O trabalho ocorre em parceria com o Instituto Senai de Inovação RS e uma instituição alemã de pesquisa.

Começou com reuniões virtuais no fim do ano passado e o primeiro encontro presencial ocorreu no estande da Novus Produtos Eletrônicos, empresa de Canoas, na Feira de Hannover, na terça-feira (23). Participaram dois pesquisadores do Instituto para Automação e Comunicação (Ifak), de Magdeburg (Alemanha), representantes do Instituto Senai de Inovação e executivos da Novus, que ao longo dessa semana estão atendendo clientes na feira.

A Novus produz sensores e trabalha com automação e conectividade – faz, por exemplo, a medição de dados e entrega para a nuvem. Agora, a ideia do novo produto é fazer com que haja conexão com satélites, sem depender de internet. O diretor de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) da Novus, Sandro Rafael dos Santos, explica que, em 2023, surgiu uma nova tecnologia para a conexão via satélite nos lugares onde não há antena de celular.

“Chamam de Narrow Band NTN (Non-Terrestrial Network), segue um padrão global, um serviço ainda embrionário na Europa, América do Norte e Oceania. A ideia é, em áreas onde não tem cobertura de celular, conseguir fazer conexão com satélite ao invés de antena terrestre, para permitir um sensoriamento remoto.”

O gerente de Tecnologia e Inovação do Senai RS, Victor Gomes, completa: “Estamos falando de algo chamado nanosatélites. São satélites que ficam em baixa órbita, não são aqueles satélites que ficam lá no espaço. É uma aplicação bem específica, que é possível hoje, não era possível há poucos anos. Não é trivial”.
O pesquisador associado do Instituto Senai de Inovação e professor da Ufrgs, Carlos Eduardo Pereira, observa que a boa relação e o intercâmbio prévio com integrantes do Ifak permitiu a aproximação. Agora, serão necessários testes para adaptar a tecnologia de comunicação usando satélites de baixa órbita. “Ver quanto tempo demora para a informação chegar no sensor e quanto tempo leva para responder. Dependendo da aplicação, se demora uma hora, não funciona. Para outra aplicação, até dois segundos pode ser muito tempo”, exemplifica.

A Novus quer usar a tecnologia e adaptar para produtos, que poderão, por exemplo, monitorar dados a distância e colher informações sobre eficiência da colheita, nível de umidade do solo – o que ajudaria em decisões estratégicas como o melhor momento para fazer irrigação, plantar ou fazer a colheita. “Queremos explorar a tecnologia que está disponível, ver se funciona e adaptar isso para os nossos produtos”, completa o diretor de P&D da Novus.
Produto pode ser aplicado para distribuição de energia e monitoramento de barragens
O diretor de marketing da Novus, Fábio Pfeiffer, observa que, embora a tecnologia tenha demanda do agro, considerando que muitas regiões do campo não tem cobertura celular, o produto poderá ter aplicação em outras frentes.

“A tecnologia para o agro é um grande mercado, mas visualizamos outros segmentos. Por exemplo, o setor de distribuição de energia tem nos demandado conectividade em áreas onde não tem cobertura. Permitiria monitorar fornecimento de energia, roubo de energia, também em abastecimento de água – ver perdas, captação de água. A conectividade permite o sensoriamento, que a Novus já faz, mas usando as tecnologias disponíveis hoje.”

Outra aplicação seria o monitoramento de barragens e represas, ver se o nível está subindo, analisar variáveis meteorológicas. O pesquisador associado do Senai RS, Carlos Eduardo Pereira, observa que sensores poderão medir o nível dos rios com acesso remoto. “Fica lendo remotamente modelos que possam prever, com algumas horas de antecedência, para alertar sobre eventuais enchentes antes da hora.”

Assim como o produto final, o modelo de negócio ainda não está definido. Uma das questões em aberto é quem vai pagar pela conexão ao satélite – se será incluído pelo fornecedor ou se será uma assinatura do cliente no campo.
Instituto alemão fará projeto e orçamento para viabilizar tecnologia
Depois de entender as necessidades da Novus durante a reunião em Hannover, agora o instituto alemão Ifak fará um projeto para ver uma solução de aplicação da tecnologia, estimando custos da empreitada. O passo seguinte será viabilizá-la, em parceria com o Senai RS.

“Primeiro vão testar a tecnologia, ver se a informação vai de um lado para o outro, depois será desenvolvido o produto, e a terceira fase é a aplicação, em uma máquina agrícola ou o que for”, resume o diretor de P&D da Novus.

O professor Carlos Eduardo Pereira, projeta que, ao propor uma solução, possivelmente o Ifak irá orçar um valor necessário, estimar quantas pessoas teriam que se dedicar ao projeto, ver o material necessário. A etapa seguinte seria a busca de recursos, através da própria empresa e instituições de fomento como a Embrapii (Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial), com o apoio do Instituto Senai de Inovação RS.

O diretor regional do Senai RS, Carlos Trein, observa que esse é o propósito da instituição, “desenvolver a indústria. Fazemos isso de várias formas, também, através de pesquisa, desenvolvimento e inovação. O Senai é muito conhecido pela formação profissional, mas temos a maior rede de tecnologia e inovação do País, que trabalha para apoiar a competitividade e estimular uma indústria mais produtiva”.

Novus participa da Feira de Hannover há três décadas
Presente na Feira de Hannover desde 1994 – e com 25 participações no evento –, a Novus, de Canoas, é, mais uma vez, a única empresa gaúcha e uma das poucas brasileiras com estande no principal evento internacional de tecnologia industrial, que acontece na Alemanha. São quatro espaços do Brasil – Novus, Fiergs, Simatec (de Minas Gerais, que está junto ao espaço da Siemens) e Indústria Metaloquímica Kels (São Paulo).

Embora nos outros anos em que a reportagem acompanhou a feira a Novus sempre registrasse bom movimento de clientes, nesta edição chama a atenção o lugar estratégico que a empresa conseguiu – expõe no Pavilhão 9, o mais movimentado da feira, junto com gigantes alemãs como Siemens, Beckoff e Pepperl+Fuchs.

“É um pavilhão disputado, o mais procurado, com grandes marcas, fazia tempo que visualizávamos estar aqui, e conseguimos, com experiência na feira e planejamento para saber o momento certo de reservar, para estar em um local conectado ao nosso negócio, de automação, e onde o público vai estar”, relata o diretor de marketing da Novus, Fábio Pfeiffer.

O executivo avalia como positiva a feira nos primeiros dias, com clientes do mundo inteiro – Ásia, África (Marrocos), América do Sul (Colômbia), América do Norte (Estados Unidos) –, além da prospecção de novos contatos.

O executivo de vendas para África, Ásia e Oriente Médio, Cláudio Oliveira, comenta, ainda que a Novus está expondo um novo produto voltado para o agro, chamado TL 400. Trata-se de um sensor a laser para medição de nível de líquidos. Por exemplo, pode ver o nível de combustível em uma máquina, quanto tem de um insumo agrícola em um reservatório. Foi desenvolvido originalmente para a fabricante de máquinas agrícolas Stara, de Não-Me-Toque, e agora ganha o mundo na Feira de Hannover.